domingo, 11 de julho de 2010

"Para você, mil vezes"

O fato de eu ter escolhido este tema hoje, pode até ser questionado por alguns por não se tratar de um tema tão antigo quanto os demais posts publicados neste blog. Mas a razão pela qual escolhi "O Caçador de Pipas" para comentar tem seus motivos, pois este fez parte da minha vida, e eu gostaria de compartilhar com vocês. Posso dizer com convicção que foi um dos melhores livros que eu já li. Recomendo a todos, porque vale a pena!
Ontem tive a oportunidade de assistir mais uma vez o filme, fruto da obra de Khaled Hosseini. E toda vez que revejo a história de Amir e Hassan, parece que tiro uma mensagem a mais. Eu poderia ter escolhido qualquer outro clássico do cinema que fez parte da minha infância, mas optei por "O Caçador de Pipas", pois este fez parte da minha vida, e cada vez que eu assisto lembro de momentos incríveis, que jamais pretendo esquecer. Além disso, gostaria de dedicar este post a nossa querida amiga Marina Contato, postadora deste blog, que também possui um carinho especial pela obra. Espero que gostem!


Este é realmente um daqueles momentos em que um filme faz justiça a um grande livro! Depois de ler “O Caçador de Pipas”, alguns fãs do romance devem se perguntar se o filme pode chegar perto para capturar suas emoções tão intensas. O filme na verdade é tão inteligente e criativo que seu poder emocional, por vezes, torna-se quase esmagadora. Cada cena do filme é exatamente como descrita pelo livro, cada fala, cada gesto dos atores, absolutamente tudo.
O romance é uma crônica da vida no Afeganistão dos anos 70 até a ditadura fundamentalista do Taliban.
A história é contada em torno do esporte de empinar pipas, e conta a trajetória de dois garotos que tem uma amizade desigual, separados pelos extremos da sociedade, através da história, religião e costumes.
O filme é sucesso no mundo todo, por retratar algo incomum e novo, pois o que conhecemos hoje do Afeganistão, através da imprensa, é um lado muito negativo, de um povo sofrido, que passa por uma guerra há quase trinta anos. Ele nos mostra que existe uma realidade diferente do país.
A utilização de metáforas está presente durante todo o filme. Uma dessas metáforas-chave aparece quando Hassan é estuprado, durante a batalha da pipa azul.O estupro mostra um paralelo de um país sendo estuprado pelos soviéticos (era exatamente este termo, “estupro”, que os afegãos utilizavam para se referirem aos abusos da invasão russa de 1979). Além disso, se considerarmos Hassan como um símbolo do Afeganistão e Amir como a comunidade internacional, podemos perceber que a comunidade internacional ficou parada assistindo, enquanto o Afeganistão era violentado por esses vários regimes. Esse episódio atormenta Amir durante toda a sua vida, até mesmo trinta anos depois, quando a Assef diz para ele fugir com Sohrab, pois isso ele já estava acostumado a fazer, pois fugiu quando Hassan mais precisava.
O elenco é impressionante, especialmente o garoto que interpreta Hassan, um personagem que é verdadeiramente inesquecível. O script reflete o cuidado com que o autor, diretor e produtor colaboraram para contar uma história real. Todos os elementos juntos são uma excelente combinação de fotografia e música, com expressões maravilhosas e um excelente roteiro que faz de “O Caçador de Pipas” um grande filme.
Em relação aos personagens protagonistas, existe um contraste muito grande entre eles.
Hassan é um personagem completamente diferente, consistente, ele é o que é, sendo incapaz de trair ou negar algo para Amir. Sua mãe fugiu com um homem logo após seu nascimento; seu pai era Toophan Agha (Baba), mas foi criado por Ali, um empregado da família, pois Hassan era descendente dos Hazaras.
Amir pode ser descrito como um personagem mutante, capaz de transmitir ternura, e ao mesmo tempo ter atitudes atrozes. É capaz de trair, mentir, ser conivente, mas sempre sabe o que está fazendo, não ignora suas falhas e fracassos. Pode ser considerado como um anti-herói, bem mais complexo, porém mais fascinante para o público, uma vez que ele assume a culpa e tem remorso. Isso faz o público se identificar com o personagem, pois todos temos defeitos profundos e precisamos nos redimir por não termos sido muito corajosos ou pelo medo ter nos desviado (e muito na nossa vida é guiado pelo medo). É muito bonito reconhecermos esse medo e nos perdoarmos, por termos medo em certos momentos e não enfrentá-los. Há muito mais profundidade psicológica nos anti-heróis, uma vez que há o fato de culpa ou de medo. Mas curar a culpa é o que mais fascina o público.
O preconceito que existe no filme em relação aos Hazaras, se deve ao fato dos pashtuns terem perseguido e oprimido os Hazaras durante o século XIX, que foram dominados com uma violência indescritível. Os pashtuns mataram os Hazaras, expulsaram-nos das suas terras, queimaram as suas casas e venderam suas mulheres como escravas. Dizia-se que essa opressão de um povo pelo outro se deveu em parte ao fato de os pashtuns serem muçulmanos sunni (sunitas), ao passo que os Hazaras são shi’a (xiitas). Os Hazaras eram chamados de “comedores de camundongos”, “narizes achatados”, “burros de carga”, entre outros.
Outro fato interessante do filme acontece quando Amir retorna em um local que era ostensivamente seu país, ele se sente como um estrangeiro e precisa reaprender todas as “manhas” do local. Na verdade, Amir não percebe que sempre, até mesmo quando vivia no Afeganistão, sempre foi como um turista, pois vivia trancado em sua bela casa, e não presenciava a dura realidade de seu país.
O filme possui duas frases muito marcantes. A primeira:
“Tenho um jeito de ser bom de novo”.
Pois todos nós temos essa chance de se redimir.
E a segunda:
“Para você, mil vezes”.
Que tem um valor emocional de que se faria qualquer coisa para alguém que se ama de verdade. Há um amor incondicional. O amor incondicional é algo por que todos ansiamos e todos temos esta meta. Essa frase tem a dimensão de levar o amor ao topo do céu, é como o movimento da pipa no final. Queremos levantar vôo, queremos ficar lá com a pipa, livres e perdoados.

Espero que tenham gostado.
Até mais!

Luis Guilherme R. Oliveira




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